31/01/2010 - 17:45
Por Roberty
Morre em Curitiba o escritor e crítico literário Wilson Martins
CURITIBA – Morreu neste sábado em Curitiba o escritor e crítico literário Wilson Martins, aos 88 anos, devido a complicações de uma cirurgia para a retirada da bexiga. Ele estava internado no Hospital Nossa Senhora das Graças.
O corpo será velado até as 17h deste domingo, na capela 3 do Cemitério Luterano, ao lado do Estádio Couto Pereira. Depois, será encaminhado para o Crematório Vaticano, também na capital paranaense, onde será cremado na segunda-feira, às 15h, em uma cerimônia reservada à família.
- Meu tio era um misto de tudo. Uma pessoa muito bem-humorada e realista. Aceitava várias condições diferentes de modo de vida das pessoas. Era nosso professor. Com ele, aprendemos os ensinamentos de vida – afirmou o sobrinho do escritor, João Luiz Guazi, de 50 anos.
Wilson Martins nasceu em São Paulo, em 1921. Formado em direito, resolveu se especializar em letras, atingindo o título de doutor. Tornou-se professor de literatura francesa na UFPR e deu aulas de literatura brasileira em universidades dos Estados Unidos. Na Universidade de Nova York ele trabalhou por 26 anos, onde se tornou professor emérito, e se aposentou em 1992.
Martins foi colunista dos jornais “O Globo”, “Jornal do Brasil” e “Gazeta do Povo”. O crítico recebeu prêmios como o Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, por duas vezes, por volumes do livro História da Inteligência Brasileira, e o prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, em 2002, pelo conjunto de sua obra.
Comentário
Narro um episódio pessoal, para demonstrar a grandeza de Wilson Martins.
Em 1994, quando saiu “América Latina, Males de Origem”, de Manoel Bonfim (escrita no começo do século 20), o impacto em mim foi imediato. Estávamos ali, discutindo o desenho do novo país. Havia um acúmulo de ideias novas, de perspectivas novas sobre os limites entre mercado e Estado, sobre os fatores de nacionalidade na formação do país. E a discussão emperrando na visão interesseira e imediatista dos economistas do Real e seus planos mágicos
O livro de Bonfim mostrava o mesmo processo, o que ocorreu no governo Campos Salles, os descalabros nas contas públicas e o papel dos “financistas”, prescrevendo cortes orçamentários que incidiam exclusivamente sobre programas sociais e sobre o interior. E usando todo o repertório de retórico dos economistas do Cruzado e do Real: estudamos fora, temos o domínio sobre a última ciência, salvaremos o país…. Era o retrato do Brasil, cem anos antes.
Entusiasmei-me pela obra, divulguei-a em várias colunas. Foi esse paralelo impressionante entre o início da República e o da Nova República que me fez continuar acompanhando os passos de cá, comparando com os de cem anos e que resultou em “Os Cabeças de Planilha”.
Quando saiu um segundo livro do Bonfim, o Zé Mário, da Topbooks, me pediu para escrever a contracapa. Dentro, dois prefácios, um do Wilson Martins desancando o Manoel Bonfim por um argumento que considerei inconsistente. Dizia que Bonfim vivia criticando os Bragança. Depois que veio a República passou a enaltecê-los, na comparação com os novos mandatários. Ora, a avaliação histórica de qualquer governante passa pela comparação com aqueles que o sucedem. Se Lula tivesse sido um desastre, FHC seria reavaliado como estadista. Martins ignorava o modelo de país desenhado na obra de Bonfim, a leitura crítica e consistente do modelo americano, a identificação da separação histórica entre Estado e Nação, os ensinamentos que passava – cem anos depois – sobre os fatores fundamentais de cidadania.
Escrevi uma coluna criticando o que considerava sua falta de atenção sobre aspectos essenciais de Bonfim, muito mais essenciais do que a análise relativa sobre os Bragança.
Tempos depois, ele deu uma entrevista para uma revista cultural, a Senhor, se não me engano. Lá, perguntaram o nome de um grande intelectual brasileiro injustamente esquecido pelo pensamento dominante. Citou Manoel Bonfim, com a observação de que muitas pessoas tinham visto nele uma visão de país avançada até para os dias de hoje.
Longe de mim chegar a um centésimo da erudição de Martins. E quem me dera ter uma parte da humildade intelectual disponível apenas nos grandes intelectuais
Disponível em: http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/2010/01/31/a-morte-de-wilson-martins-o-critico/
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